Alexandre Azevedo, do IPq, fala sobre imagem corporal, em entrevista Universa/UOL.
Geração Ozempic: por que voltamos a emagrecer e quais as consequências
Rafaela Polode Universa, em São Paulo
10/05/2024 04h05
Parece que foi ontem que a internet puxou um movimento defendendo o amor próprio e a defesa dos corpos reais. A sensação, contudo, é que não durou muito tempo.
O crescimento do consumo de medicamentos para emagrecimento, como Ozempic, e a volta de modelos magérrimas nas passarelas colocou em xeque essa fuga do padrão.
A psicóloga Alana Anijar, especializada em terapia cognitivo-comportamental, diz que está observando uma tendência desse reforço da magreza desde o ano passado, principalmente no mundo das celebridades.
Ela usou as Kardashians como exemplo: as irmãs deixaram de lado os corpos curvilíneos para assumirem formas mais magras.
“É um trabalho árduo fazer com que as mulheres consigam respeitar seus corpos e suas imperfeições. A autoimagem é parte da autoestima. Tudo bem correr atrás do que é melhor dentro daquilo que é saudável, mas a busca por esse padrão, que encoraja até a comer menos, não é bom para a saúde mental”, explica.
Para a psicanalista Joana de Vilhena Novaes, coordenadora do Núcleo de Doenças da Beleza da PUC-Rio, essa acentuada busca pelo emagrecimento, ainda é consequência da pandemia.
“É quase um momento pós-guerra. Durante o isolamento, a estética saiu de cena, porque o que imperava era a sobrevivência biológica. Agora, no momento pós-pandêmico, ela gera uma sensação oposta”,
diz Novaes.
O abalo da autoestima destas mulheres, que se comparam às famosas, é maior do que imaginamos. Muitas podem, por exemplo, acreditar que não são dignas de serem amadas apenas por não estarem em um suposto ‘peso ideal’
“Não existe um tipo de corpo que faça a pessoa não merecer um final feliz. Por isso, é importante para mim mostrá-los nas páginas dos livros. Está cada vez mais comum, mas o que quero dizer mesmo com meus livros é que você pode ser uma mulher desejada, amada e encontrar a felicidade”, diz Olivia Dade, autora norte-americana que se dedica e acredita no poder da representatividade.
Impacto mental
A gente conhece aquele ditado: “água mole em pedra dura, tanto bate até que fura”. O mesmo funciona para novos padrões. De tanto se falar novamente em corpo magro, as pessoas passam a acreditar que é isso que elas precisam – principalmente mulheres.
“Vamos certamente ver uma repercussão na saúde mental e aumento em distúrbios alimentares”, diz Anijar. E a consequência do grande amor ao corpo magro é, também, o aumento da gordofobia.
“O fato é que qualquer movimento de idealização de um corpo magro pode promover uma onda de comportamentos espelhados, em especial em pessoas emocionalmente vulneráveis, fazendo-as perder peso, muitas vezes, sem real necessidade”, diz Azevedo.
Anijar, contudo, não acredita que voltamos à estaca zero. “Acho que há muito espaço para reportagens e influenciadores para produzir conteúdo conscientizando mulheres sobre o que está acontecendo, para que elas possam fazer escolhas e se conscientizarem que é mais fácil evitar seguir esses padrões que nos maltratam do que abraçá-los”, diz.
Para o psiquiatra Alexandre Pinto de Azevedo, coordenador do grupo especializado em comer compulsivo e obesidade do Programa de Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria do HCFMUSP, criar a sensação de pertencimento, seja em livros, filmes ou séries, permite uma aceitação emocional àqueles que se veem refletidos ali.
“Estudos médicos e evidências científicas mostraram que todos os tamanhos de corpo podem ser saudáveis. Devemos reconhecer, rever nossos preconceitos e entender que pessoas de tamanhos, formas e pesos diferentes podem ter exatamente o mesmo nível de saúde”,
diz Azevedo
Seguindo nessa linha, Dade ficou conhecida por seus romances onde as protagonistas são mulheres gordas.
No Brasil, ela acaba de lançar “Alerta de Spoiler” (Intrínseca) que conta a história de amor entre uma geóloga desconhecida e um ator famoso e muito desejado que começam a viver um romance.
“O peso das pessoas é um assunto particular. Nossos corpos não existem para serem julgados”, disse em entrevista à Universa.
“Ver uma versão de si mesma em histórias, sendo digna de amor e respeito, é transformador.”