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Profissional de Ouro.

Para inspirar e motivar pessoas neste novo ano, o portal Uol/esporte traz a história de garra e superação de Cláudio Oliveira, que, além de atuar na manutenção do IPq é atleta profissional de patinação.

Treino e esfregão das 4h30 à 00h: a vida de um patinador na periferia de SP

Cláudio Oliveira, esquiador que mora no Jardim Ângela, em São Paulo - Arquivo pessoal
Cláudio Oliveira, esquiador que mora no Jardim Ângela, em São PauloImagem: Arquivo pessoal

Paula Nogueira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

02/01/2022 04h00

Pelos corredores do IPq (Instituto de Psiquiatria) do Hospital das Clínicas de São Paulo, quem vê Cláudio Oliveira, 32 anos, desentupindo vasos sanitários, não imagina que se trata de um atleta profissional. E dos bons. Em dezembro, ele levou para casa a medalha de ouro da 2ª edição do Inline Marathon – Copa Sul-Americana – Master 30, competição de patinação de velocidade que aconteceu em Foz do Iguaçu, realizada pela Federação Paranaense de Patinação.

Oliveira trabalha há um ano na manutenção do IPq. Todos os dias empurra seu carrinho de mão, onde pendura sempre uma frase de esperança que escreve pelas manhãs. No trabalho seu apelido é “atleta” ou “Claudinho”. Mas também poderia ser “dançarino”, porque, tal como nas pistas de patins, ele dança pelos corredores, enquanto cumprimenta todos que passam.

Morador do Jardim Ângela, Oliveira teve seu primeiro contato com o esporte na periferia de São Paulo. Na rua da sua casa viu seu vizinho passar com um patins novinho. O garoto havia ganhado da patroa da mãe. Quando viu as rodinhas deslizando no asfalto, foi paixão à primeira vista. Na tentativa de dar uma volta também, pediu o patins emprestado ao amigo, mas caiu logo de primeira e não pode mais andar.

Apesar dos tropeços no início, ele não desistiu. Um dia, sua mãe, Jozinete, chegou em casa com um par de patins de presente, porém não do tamanho certo. “Era alguns números maior do que o meu, mas foi a melhor coisa do mundo, era como se fosse só eu e o patins, não existia mais o mundo”, lembra Oliveira.

A partir daquele dia a vida era fazer manobras de todos os tipos. Em cima das rodinhas, saltava caixas, descia corrimão, pulava escadas, até que um dia duas rodas quebraram. Ele seguiu andando como dava, com quatro rodas em um pé e duas no outro. E o patins amarrado com arame.

Esporte venceu a depressão

No começo da adolescência, aos 14 anos, Oliveira começou a trabalhar e logo comprou um par de patins usados para treinar. As coisas estavam bem, até que a vida lhe deu um tombo: a morte do pai. “Ele ficou internado um mês e ninguém me avisou para não atrapalhar meus treinos. Foi um choque e entrei em depressão”, conta Oliveira.

Nessa época, ele fazia parte de uma equipe de Guarulhos, mas desistiu dos treinos por causa da doença. Chegou a doar o patins que usava nas competições. “Fiquei quase um ano com depressão, perdi o emprego, não queria sair de casa e nem fazer mais nada”, relembra o patinador.

Depois de um tempo ele tentou reagir por outros caminhos, foi estudar e chegou a fazer stand up em barzinhos à noite por um tempo. Mas, pouco depois, sentiu que só o esporte seria capaz de tirá-lo daquele estado. A vontade de voltar para o patins foi maior do que a depressão. “Voltei com toda a garra e toda a competição que eu ganho é para meu pai”, afirma.

De volta às pistas

Oliveira - Arquivo pessoal - Arquivo pessoal
O esquiador Cláudio Oliveira trabalha na manutenção do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas de São Paulo

Imagem: Arquivo pessoal

A inclinação para o esporte era evidente e no Parque do Ibirapuera, ponto de encontro e de treinos de equipes profissionais de patins, Oliveira foi visto por um treinador. Apesar do patins velho, o perfil do rapaz chamou atenção. E o convite veio na sequência.

“Eu vi que ele tinha uma força física legal, vontade e corria muito. Chamei ele e disse que se quisesse podia ser atleta um dia, mas tinha que trocar o patins e ingressar na carreira”, explica, Renildo Dank, o primeiro professor do Oliveira e orientador da equipe Esquadrão Speed.

Hoje, Oliveira divide a rotina de atleta com a de trabalhador braçal. Ele acorda antes de clarear o dia, às quatro e meia, e prepara o café: frango, iogurte, batata doce e, em dias alternados, 15 ovos. Chega ao trabalho antes das sete da manhã, e geralmente enfrenta um dia cheio de tarefas. Na hora do almoço, corre para academia do instituto e treina por uma hora, depois almoça rapidamente e volta para a labuta. Após o expediente, verifica no grupo de WhatsApp onde será o treino, que acontece sete vezes por semana, em algum canto da cidade, sempre às oito da noite. Segue para o local, de onde vai embora às 23 horas. Na volta, geralmente caminha em torno de 40 minutos até chegar em sua casa.

Prefere voltar andando pelas ruas do Jardim Ângela de madrugada do que ficar parado em pontos de ônibus. “Tenho medo da violência e de ser assaltado.”

O esforço e a dedicação já renderam várias medalhas: seis de ouro, quatro de prata e uma de bronze. Atualmente, ele treina na equipe Impetus, fundada pela colombiana Criss Villa. Ela conta que logo no início percebeu potencial e muita resistência do rapaz. “Ele é um dos melhores, em pouco tempo se destacou muito”, comenta a treinadora.

As dificuldades ainda permanecem. Sem patrocínio ou apoio financeiro, ele conseguiu comprar seu patins profissional há poucos meses para continuar competindo nas provas profissionais. “Foram cinco meses juntando dinheiro para pagar a entrada e parcelar o restante, por volta de quatro mil reais. Não é uma ‘Ferrari’, mas já ganhei campeonatos disputando com patins bem melhores do que o meu”, declara Oliveira.