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Rosa Magaly Morais, especialista em Infância e Adolescência e médica colaboradora do Programa de Diagnóstico do Transtorno do Espectro do Autismo no IPq (HC-FMUSP), fala sobre  microbioma intestinal , em matéria da Revista Crescer. Confira!

 

Exame de fezes pode ser aliado para diagnóstico de autismo — Foto: Freepik

Exame de fezes pode ser aliado para diagnóstico de autismo — Foto: Freepik

O trabalho analisou 1.627 amostras fecais de crianças entre 1 e 13 anos diagnosticadas ou não com transtorno do espectro autista (TEA). Diferentemente dos outros estudos, a nova pesquisa não só analisou a presença de bactérias no microbioma intestinal dos participantes, mas também vírus, fungos e arqueas. Quando avaliaram grupos isolados de micro-organismos, a partir de inteligência artificial, os pesquisadores conseguiram diferenciar as crianças autistas das neurotípicas com uma precisão de 68% a 87%. Esse número aumentou para 91% ao se combinar diferentes tipos de micro-organismos.

Diante dessas descobertas, é natural que as famílias tenham questionamentos sobre o impacto desses dados no diagnóstico do autismo. Afinal, atualmente, o transtorno ainda é reconhecido a partir de sinais clínicos com diagnósticos difíceis e demorados, muitas vezes. Para responder às dúvidas dos pais, a CRESCER conversou com especialistas que comentaram como o microbioma intestinal pode levar a identificação do transtorno do espectro autista.

Qual é o papel do microbioma intestinal na saúde infantil?

Segundo a psiquiatra Rosa Magaly Morais, especialista em Infância e Adolescência e médica colaboradora do Programa de Diagnóstico do Transtorno do Espectro do Autismo no IPq (HC-FMUSP), o microbioma intestinal — composto por bactérias, fungos e vírus — desempenha um papel importante na saúde infantil, incluindo a digestão de alimentos, especialmente aqueles que o corpo humano tem dificuldade de digerir, como as fibras.

Ele atua ainda na produção de vitaminas essenciais, como B e K, e auxilia na proteção contra infecções e doenças autoimunes. No entanto, pesquisas preliminares também associam o microbioma intestinal a transtornos psiquiátricos e de neurodesenvolvimento.

Por que o microbioma das crianças autistas seria diferente?

Responder a essa pergunta não é simples. De acordo com o neuropediatra Ricardo Alexandre Sato Watanabe, do Instituto PENSI, muitos fatores podem influenciar a flora intestinal, como a exposição a antibióticos e a certos alimentos. “Até entre gêmeos idênticos a microbiota não é igual. Temos algumas alterações. Como há muitas variantes, não sabemos o porquê, mas sabemos que é diferente”, explica.

No entanto, os especialistas apontam alguns caminhos que poderiam explicar essa associação. A psiquiatra do IPq menciona que os atributos genéticos e clínicos do TEA podem competir para a modificação do microbioma intestinal das crianças autistas. “Os padrões alimentares seletivos ou restritivos podem levar a uma menor diversidade de bactérias intestinais e a problemas gastrointestinais.”

Quais seriam os benefícios de diagnosticar o autismo por biomarcadores intestinais?

O autismo ainda não é diagnosticado por exames laboratoriais, mas sim a partir de uma avaliação do comportamento das crianças e a presença de alterações sensório-motoras. Além disso, os profissionais realizam entrevistas com os pacientes e, quando possível, com os pais ou responsáveis. “Não há biomarcadores biológicos claros para o TEA. Diferentemente de outras condições médicas, como pneumonia ou hipertensão, não há exames laboratoriais que comprovem a existência do autismo”, destaca a médica.

Para chegar ao diagnóstico, é necessário recorrer a um especialista experiente que tenha conhecimento sobre a heterogeneidade das apresentações do quadro clínico. A falta de recursos e de profissionais capacitados pode atrasar o diagnóstico de autismo.

Por isso, os dados deste trabalho são tão empolgantes para os pesquisadores. “O estudo abre a possibilidade para análise da microbiota intestinal, que pode ser coletada de forma não invasiva, afinal seria um exame de fezes, como forma de ajudar no diagnóstico do autismo”, ressalta o neuropediatra Ricardo Watanabe. Além de ser um exame não invasivo e fácil de coletar, Rosa Magaly Morais destaca que esse tipo de exame permitiria a personalização do tratamento de acordo com a composição do microbioma de cada indivíduo.

Quais são as limitações do estudo?

O estudo, publicado na Nature, de fato, trouxe dados animadores com relação ao diagnóstico do autismo. Contudo, os especialistas ponderam para algumas limitações da pesquisa. “ É importante lembrar que os resultados são iniciais e devem ser avaliados com cautela. É necessário esperar que outros grupos de pesquisa validem esses achados por meio de investigação em populações mais diversas. No entanto, a possibilidade de diferenciar crianças com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) de crianças neurotípicas com alta precisão, utilizando a composição do microbioma intestinal, incluindo bactérias, fungos e vírus, bem como suas funções, é uma ferramenta valiosa”, afirma a psiquiatra do IPq.

Outro ponto levantado pela especialista é que alguns fatores podem confundir os resultados, sendo difícil de controlar todos os elementos que influenciam o microbioma. “Um dos grandes desafios para usar esse exame clinicamente é estabelecer padrões que levem em conta a variabilidade individual, influenciada por idade, dieta, hábitos intestinais, uso de medicamentos, ambiente e genética, entre outros fatores”, diz a médica.

Além disso, a psiquiatra chama a atenção para a heterogeneidade na apresentação do TEA, que, muitas vezes, vem acompanhada de outras condições de saúde, psiquiátricas e clínicas, que também podem alterar a flora intestinal. “Embora alguns estudos sugiram uma relação entre mudanças no microbioma e o TEA, estabelecer uma relação causal direta é complicado. É essencial que os resultados sejam reproduzidos e validados de forma independente em diferentes populações e contextos clínicos para garantir sua confiabilidade”, reforça.

O neuropediatra do Instituto PENSI reforça ainda que esse tipo de análise deveria ser aplicada em populações diferentes. “Será que a microbiota de uma criança brasileira irá apresentar o mesmo resultado? Temos que fazer um estudo amplo para conseguir validar esses dados”, finaliza o médico.

https://revistacrescer.globo.com/criancas/saude/noticia/2024/09/exame-de-fezes-poderia-diagnosticar-o-autismo.ghtml