Daniel Barros, do IPq, fala sobre sentimentos, em matéria do Estadão.
Não fuja da tristeza: sentimento é importante, defendem especialistas; veja como lidar com ele
Sentimentos negativos têm uma função reguladora na saúde mental; entenda como abordar isso desde a infância
Por Larissa Costa, especial para o Estadão
Foi com base nessa reflexão que o psiquiatra e professor Daniel Martins de Barros escreveu o livro “O lado bom do lado ruim” (Editora Sextante), no qual explica o papel das sensações negativas. “A tristeza é uma emoção que sinaliza a perda para nós”, define. “Ela engloba um conjunto de reações físicas e psicológicas”.
O que não percebemos no dia a dia é a função social desse sentimento nas relações. “As emoções são formas de recebermos informações do nosso entorno, e também de repassarmos informações para as pessoas”, afirma Barros.
De acordo com o psicólogo Jan Luiz Leonardi, a tristeza é uma emoção que nos ajuda a compreender melhor determinadas experiências. “Ela nos conecta com nossas necessidades e nos ajuda a dar mais valor ao que é realmente importante”, explica.
“Por exemplo, quando sentimos tristeza por estar longe de alguém querido, isso nos lembra o quanto essa pessoa significa para nós. Ela também pode nos motivar a buscar apoio, a nos conectar com outras pessoas ou até mesmo a fazer mudanças”.
Não fuja da tristeza
Se na psicologia sentimentos de melancolia e infelicidade preenchem boa parte das sessões no divã, na filosofia essa emoção também tem muito destaque. Ela foi tratada por diversos pensadores, de Aristóteles (384 – 322 a.C.) a Friedrich Nietzsche (1844-1900).
Partindo do livro “Happycracia – fabricando cidadãos felizes”, a psicóloga e filósofa Regiane Lorenzetti critica o modo de pensar contemporâneo, que coloca a tristeza como uma derrota pessoal. “O neoliberalismo se ocupa de um sujeito produtivo, que precisa fazer até mesmo a própria felicidade”.
“O resultado de uma vida com tantas responsabilidades é um colapso social e psicológico”, assegura Regiane. “Essa busca pela felicidade tem como sintoma uma tristeza generalizada”.
Por mais incômoda que a infelicidade seja, tentar reprimi-la ou ignorá-la pode trazer prejuízos. “Pesquisas sugerem que a supressão de emoções pode aumentar a ativação do sistema nervoso autônomo”, acrescenta Leonardi. “Isso pode levar a alterações fisiológicas que se manifestam como sintomas físicos, como dor crônica, tensão muscular, distúrbios gastrointestinais e fadiga”.
O “remédio”, de acordo com o psicólogo, é sentir. “Aceitar a tristeza não significa ficar preso a ela para sempre. É sobre dar espaço para que ela exista, aprender com ela e depois seguir em frente”.
Falando com crianças – e com nós mesmos
E se a infelicidade é parte corriqueira da vida, então já deveríamos estar habituados a ela, certo? Mas nem sempre é o que ocorre.
Para Barros, não só temos dificuldade em lidar com a tristeza como também em acolher e nomear o que sentimos. Para virar esse jogo, o psiquiatra aconselha a ensinar a função das emoções negativas desde a infância.
“Você pode falar para a criança que ela está triste porque algo que foi perdido era importante, e como esse sentimento é uma forma de digerir a perda. E também ensinar que todas as emoções vêm e vão. Elas passam”, orienta.
Lygia Teresa Dorigon, psicóloga e psicoterapeuta de crianças e adolescentes, concorda. “Podemos conversar com as crianças sobre emoções que nos causam sensações agradáveis e outras, desagradáveis, mas tendo clareza de que todas têm uma função e são importantes”.
Além disso, a psicóloga reafirma que esse ensinamento ajuda crianças a entenderem melhor como se sentem e como estão reagindo. “Um indivíduo que se conhece está em uma posição privilegiada para gerenciar seus comportamentos e lidar melhor com as situações difíceis. Só somos capazes de lidar com o que conhecemos”.
Mas ainda temos um caminho a trilhar enquanto sociedade no sentido de sermos mais empáticos com nossas emoções. Lygia recorda ainda a distinção de gênero que se faz entre quem pode expressar determinado sentimento – ideia representada por frases como “homem não chora” ou “engole o choro”.
Quando se preocupar
Por fim, é sempre válido ressaltar: infelicidade constante e incontrolável não é algo normal.
“Se a tristeza começa a durar muito tempo, se fica tão forte que impede a pessoa de fazer coisas do dia a dia, ou se o indivíduo sente que nada mais o faz feliz, isso pode indicar que não é só uma emoção passageira, mas talvez parte de um problema maior, como a depressão”, diferencia Leonardi.
Nesses casos, o conselho é um só: busque ajuda – de amigos, familiares e profissionais da saúde. “Ninguém deve enfrentar isso sozinho”, defende o psicólogo.